08 outubro 2011

O pomar de Steve Jobs

No último dia 05 o mundo ficou mais triste e perdeu um pouco a sua beleza. Recebemos pelos meios de comunicação, em especial pela internet, a notícia da morte de Steve Jobs.
Apesar de vivermos na chamada “aldeia global”, muitos talvez não percebam o alcance de seu legado. Minha relação com o “Tio Steve’ - era assim que eu costumava chamá-lo quando eu usava um dos produtos da Apple - se funde com o meu casamento.


Nos idos dos anos 2000 conheci o Cleber, um admirador e consumidor apaixonados das maçãs de Jobs. Nasci em 1975 e minha geração acompanhou, no final dos anos 80, a chegada dos computadores em nosso cotidiano. Telas somente com o prompt verde piscando, disquetões e eu nem imaginava como seria a vida com o click do mouse.
No ano em que conheci meu futuro marido, os computadores com processadores Pentium e o Sistema Operacional Windows 95 estavam no auge. Todos cobiçavam ter um em casa. Era também o tempo do modem com 28.800 bps de velocidade (Internet era uma grande novidade). Quando fui pela primeira vez em sua casa, vi que em seu quarto haviam dois computadores: um “PC” e um “Macintosh”. Estava ele muito bem coberto com capinhas plásticas. Confesso que tomei um susto e perguntei o que era aquilo. Disse-me ele com orgulho: - É meu Mac! Confesso que não entendi nada, pois nunca tinha ouvido aquela palavra tão pequena e tão poderosa. Deixe-me explicar um detalhe: Cleber nasceu em 1969 e pode acompanhar a revolução digital com mais detalhes que eu. Ele viu o “bebê” nascer e eu o conheci já criança.
Ele removeu as capas daquele computador – que ele insistia em chamar de Mac -, e eu vi aquela maçazinha colorida, como quando a TV fica fora do ar. Ao ligar o “Mac”, tentou me mostrar as maravilhas que seu computador era capaz de fazer. Sem entender nada, perguntei: - Por que o mouse não tem três botões? No que ele me respondeu: - Por que é um Mac!


Achei aquele “R2D2” muito abusado e seu sistema operacional obsoleto, que mais lembrava o Windows 3.1. Após o nosso casamento o “Mac” foi morar conosco. Aos poucos, Cleber foi me ensinando a usá-lo. Fui percebendo que as coisas que eu achava modernas ‘Tio Steve” já as tinha incorporado ao Mac e ao seu Sistema Operacional O.S. anos antes.
E eu acabei me apaixonando por aquele Mac, que no fundo era tratado como um filhote querido.
Com o passar dos anos as “maçãs de Tio Steve” foram ganhando ainda mais espaço em nossa vidas. Cleber passava as madrugadas acompanhando os leilões no Mercado Livre para comprar computadores Apples usados mais modernos. Lembro-me muito bem da chegada do iMac G3 verde – uma obra prima do design, em nossa casa. Graças ao tio Steve até os baldes de limpeza são mais bonitos hoje – translúcidos, ergonômicos e coloridos. Os PC eram todos na cor bege e as “maçãs” que ele nos presenteou eram de todas as cores. Até quis que ele comprasse um iMac G3 pink só para mim.


Depois veio o iBook – outra gracinha. Mais um ícone do design. Mas não conseguimos adquirir todas as maravilhas da “fantástica fábrica de maçãs”. O preço era proibitivo para nossos bolsos. Há modelos que foram descontinuados muito rapidamente e que até hoje são sinôminos de sofisticação e beleza.




Tio Steve nos levou ao século XXI para mais uma revolução digital. Sua vida foi desafiar e quebrar paradigmas. Mudou nossa maneira de ouvir música com seu iPod, criou um novo mercado para a indústria fonográfica, mudou nossa maneira de nos relacionarmos com os aparelhos celulares e com a leitura, sem contar a sua aposta no cinema de animação com a Pixar (pra falar disso eu teria que escrever outro post).


Foi contra a todas as tendências. Só para citar um exemplo, quando todos os fabricantes de celulares fabricavam telefones cada vez menores, eis que vem ao mundo o iPhone. Na ocasião de seu lançamento (as conferências de Steve Jobs para a apresentação de uma nova “Maçã” eram um acontecimento a parte) ele mostra ao mundo um celular enorme e quase sem botões. Hoje queremos que tudo tenha tela de toque e que incorpore as mais diversas funções em um só produto sem consumir rapidamente a bateria do aparelho.


A última colheita de seu pomar para nós foi o iPad. Cleber me deu de presente em meu último aniversário, que coincidiu com o lançamento oficial do produto no Brasil. Mais uma vez o Mago da Maçãs nos encantou. Eu amo os livros e me encantei com essa nova maneira de me relacionar com eles através do iPad.
De 2000 para 2011 eu e Cleber caminhamos juntos e tivemos a Joana. Quando o iPad entrou para a família ela estava com 2 anos de idade. Ficamos estarrecidos quando ela, assim que nos viu manuseando o “brinquedinho novo”, tomou de minhas mãos e foi mexendo com uma intimidade inexplicável, como se aquilo sempre tivesse feito parte da vida dela.
Em sua última conferência, no lançamento oficial do iPad2, tio Steve fez menção de como essa “maçã” abriu fronteiras para pessoas que em princípio não eram consideradas público alvo de mercado: bebês e pessoas com necessidades especiais, por exemplo. Ele contou como pacientes com diversos graus de paralisia cerebral e Alzheimer interagiam com iPad.


Jobs não inventou sozinho todas essas coisas, mas foi a Apple que fez com que elas chegassem às nossas mãos de uma maneira que pudéssemos, nós mesmos, impor todas essas mudanças ao mundo Pós Moderno.
Ele sempre foi enfático ao afirmar que o mundo dos computadores não deveria ser sisudo e austero. Para mim, o legado de Steve Jobs será sua obsessão pela alegria, simplicidade e beleza dos produtos e na maneira que os usamos. A cada lançamento seus consumidores devotos e muitos novos admiradores da marca corriam para as lojas na expectativa de serem os primeiros a experimentar o delicioso sabor de cada nova safra daquele pomar.
Chico Buarque disse uma vez em uma entrevista que “música para ser boa tinha que ser como a casa de Oscar (Niemayer)”. Os anos passarão, mas certamente continuaremos com a certeza de que inovações tecnológicas, para serem boas, precisarão ser saborosas como aquelas brilhantes maçãs do Steve Jobs.

Steve Jobs 1955-2011

* Sugestão de filme: Piratas do Vale do Silício, EUA, 1999. Drama, 95 min.


bagikan